quinta-feira, 11 de julho de 2013

Quem mata mais rápido uma garrafa de vodka?



Eu e Luis estavamos mesmo bem entediados com aquilo tudo, eu com a minha vida, ele com a dele, quando nos reunimos no meu apartamento, achei que iriamos bater figurinhas, mas dois marmanjos de 23 anos não podiam comprar figurinhas nas bancas, seria ao menos esquisito. Pensei em enfiar o dedo no cu dele, ele enfiar no meu cu e um masturbar ao outro, mas isso, além de doentio, era contra nossa ideologia de fodermos mulheres. Nada de ideias, quando percebi que eu tinha duas garrafas lacradas de vodka, acho que era Raskov, aliás, era Zamiroff, russa ela não era, é como aqueles brasileiros que tem o nome estilo "Maicon", fazendo alusão a "Michael", ou ainda "Jônatas", fazendo alusão à "Jonathan", e o meu favorito que é um que vi outro dia, que escreviam "Jorge Rarisson", que fazia alusão ao famoso Beatle "George Harrison". Russa esta porra não era, não mesmo!

- Vamos beber! - Luis me disse
- Sei lá mano, precisamos botar mais graça nesse lance de beber... É sempre a mesma coisa, sempre gorfos iguais, sempre do mesmo jeito.
- A graça de beber é ficar bêbado. Porra Carlos, cê sempre disse isso, tá virando bicha é? Quer que eu enfie o dedo NO TEU RABO!? CHUCHU!
- Para com essa merda mano - eu disse - Só quero deixar as coisas mais divertidas.

Peguei um lençol que estava no sofá, subi na mesa de jantar, amarrei o lençol em volta do pescoço, agora eu fazia alusão à um super herói, mas super eu não era, herói muito menos! Coloquei o indicador direito em riste para o alto, olhei pomposamente para o teto e exclamei

- Façamos um jogo!

Luis me olhou lá de baixo, me senti superior a ele, isso era bem até que bem legal, pude sentir o cuzinho dele fechar de medo. Mesmo assim ele me afrontou

- Que mané porra de jogo mano! Cê sempre foi contra essas merdas de drinking games, sempre quis beber pra cacete e estourar e foda-se a porra toda... Cê tá virando bicha, tá virando uma baitolinha de merda. QUER QUE EU ENFIE O DEDO NO TEU CU, SUA VIRGEM DE MERDA!?

Aquele tom me irritava, mas eu sabia que Luis era um falastrão, e seus xingamentos eram somente o reflexo de sua frustração, do seu ódio pelas mulheres que lhe chutaram as bolas e pelos empregos perdidos, e digo mais, pelos fracassos em geral, ele era um fracasso e descarregava escárnio e xingamentos pra se sentir melhor. Ainda assim ele era um cara bacana...

- Este jogo será diferente! - eu ainda estava lá em cima da mesa, todo pomposo e com o dedo em riste e falando com uma voz mais firme do que uma buceta de uma garota de 14 anos semi-virgem - Uma garrafa pra cada. Quem matar primeiro sua garrafa vence. São permitidos gorfos, choros, apagões e tudo mais. A única regra é que não podemos beber mais de um shot a cada minuto!

Tínhamos o costume de beber uns dois ou três shots seguidos, e isso sempre acabava com a bebedeira rápido demais. Aquela bebedeira entediada, em específico aquela bebedeira, eu queria curtir um pouco mais, por isso que somente um shot por minuto.

- Tá bom Carlos, foda-se. Desce dessa merda de mesa e vamos beber logo que estou com sede e frustrado, e por isso preciso beber - Luis me disse, tentando me puxar pelo pé.

Eu chutei a mão dele de leve, pra me desgarrar daquele puxão, desci da mesa num pulo, tirei o lençol que estava em volta do pescoço. Peguei as garrafas, nos sentamos na mesa, peguei os copos de shot. Olhei pra ele com uma seriedade judaica.

- Que os jogos comecem! - eu disse e tomamos o primeiro shot.

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No início tudo parecia muito fácil e imbecil. Afinal, tudo na vida era assim, sempre muito fácil e imbecil no começo, sempre muito simples e sem dificuldades e sem problemas. Era tudo uma questão da repetição, sempre me fodia pelas repetições e por ser repetitivo. Parecia que esse lance de beber um shot por minuto era bem simples, e honestamente, era sim. Tomavamos nosso shot, ficavamos quietos, olhando um para o outro, olhando no relógio, aguardando o próximo shot. Bebiamos e repetiamos o processo. Achei que seria assim a noite toda, ledo engano, ahhhh ledo engano da minha parte. Não serei mentiroso, nem vou pagar de forte, nem pauzudo eu era, poderia ser honesto com os drinks. Os primeiros cinco shots desceram suaves. Meu sexto eu esperei um pouco mais, enquanto Luis tomou no tempo.

- Hahahaha seu merda, vou ganhar de você, sua bicha do caralho, chupador de pintos doentes! - ele gargalhava com suas palavras, eu só assistia com cara de bêbado.

Os drinks prosseguiam, ele tinha uns dois drinks na minha frente. Começamos a divagar.

- Não sei o que há de errado com meu pai - eu disse
- O problema foi você ter nascido - ele disse
- Tenho que morrer? - perguntei, virando outro shot
- Não, isso geraria mais problemas - ele disse, mas sem virar outro shot

Após essa leve divagação, ele tomou mais uma dose. Gorfou na sequência, acho que ele nem chegou a engolir essa dose. Eu vi seu gorfo no chão, era quase tudo líquido, quase tudo. Comíamos pouco nessa altura de nossas vidas.

- Olha ali Carlos! - ele disse enquanto apontava pro chão - O miojo que comi ontem! Ainda está ali, isso não é lindo?
- Sim, é muito lindo... Tá de boas pra beber ainda?
- Claro que sim - ele disse, limpando a boca com as costas da mão e mandando outro shot pela goela, dessa vez sem vomitar.

A melancolia assolava meu corpo, eu havia me tornado o pior tipo de bêbado, o depressivo. Nada de baladas, conversas chatas, abraços, risos, pulos de alegria e diversão. Somente a letargia do fracasso, a apatia do silêncio e a certeza que a morte era melhor do que aquilo. Um fracassado. Eu era o fracasso, Luis era um fracasso, a presidente Dilma era um fracasso, o povo que achava que o FaceBook seria pago era um fracasso. Merda, o que estava acontecendo!?

Eu já não sentia minha face quando olhei que a garrafa passara um pouco abaixo da metade, estavamos praticamente empatados. Os shots eram praticamente de 3 em 3 ou de 4 em 4 minutos. Tudo parecia girar, meu fígado resistia bravamente ainda, sem gorfos. "Parabéns bravo cavalheiro, parabéns!" Eu elogiava meu fígado em pensamento, prometia pra ele brejinhas quando tudo aquilo acabasse, ele sempre adorava brejinhas, eu nem tanto, mas ele curtia o lúpulo e o malte pra cacete.

- Preciso de um lugar pra me esconder. - Luis, agora ele divagava
- Um santuário! - eu disse
- Sim, preciso me sentir seguro, preciso de segurança
- Vamos virar monges, ou hippies, ou qualquer merda que fuja dessa sociedade... Eu não aguento mais Luis, nada mais faz sentido. Precisamos de um esconderijo, e dos bons! - eu disse, coloquei de novo o indicador em riste, agora sem a mesma força, por causa do alcool
- Vamos beber e beber. Alguma hora todo o mundo fará sentido, não é possível.
- Pois é... Vamos mudar o mundo? Certeza que não. Somos só o resto do lixo dos anos 80 man. - eu já divagava ainda mais, mas foda-se.
- Com certeza. Pais drogados e gravidez indesejada. Somos somente isso. O que esperar do amanhã além de uma linha de coca e uma garrafa na mão!?
- Isso merece um brinde - levantamos nossos copos de shot, brindamos, viramos, e agora eu gorfei.

Aquele vômito estava bem em cima da mesa. Esqueci que poderia ter qualquer tipo de pudor, passei o braço esquerdo por completo em cima da mesa, joguei o excesso do vômito no chão, o que ficou no meu braço foi lambido por eu mesmo. Na sequência virei outro shot de vodka e tudo voltou ao normal. Luis? Ele só ria, o filho da puta só ria da cena toda.

A coceira na minha barba só aumentava quando olhei pra garrafa. Ela ainda estava longe do fim, e o mais inacreditável foi o fato de que ainda não tinha apagado. Luis eu não sei, mas eu ainda lembrava de tudo. Achei que poderia matar tudo e lembrar de tudo e acordar sem ressaca no dia seguinte. Ledo engano, ledo engano. Quando percebi que Luis havia deitado em cima da mesa, achei que ele dormia, e pareceu ser isso mesmo. Ele tinha uma garrafa mais vazia do que a minha. Quebrei as regras, afinal, um pouco de trapaça sempre ajudou a sociedade a ser o que ela é hoje. Virei a garrafa em várias goladas e nem lembro da garrafa saindo da minha boca quando apaguei.

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No dia seguinte o cenário era catastrófico. Vômito. O apartamento cheirava a vômito e nada mais, ahhh sim, e a melancolia e frustração, mas esses cheiros não estão ainda "catalogados" pela sociedade, portanto fiquemos com vômito mesmo. E a dor nas costas era infernal, a de cabeça era uma merda, e a do fígado, pra mim, sempre foi a pior, e nesse caso era sim a pior. Luis ainda dormia em cima da mesa quando acordei. Olhei as garrafas, havia vencido ele por muito pouco. Deixei ele dormir, me levantei, fui na geladeira, peguei uma breja, virei metade dela numa única talagada, senti que meu fígado agradeceu, eu lhe disse "não há de que", e voltei pra sala. Sentei no sofá, passava desenhos pela manhã no SBT. Fiquei ali, assistindo, bebendo brejas, bem na maciota, sabendo que eu tinha ganho o jogo da noite anterior, mas sabendo ainda mais que nesse jogo eram todos fracassados.

Zaratustra

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