segunda-feira, 8 de julho de 2013

Mais bebedeira, ateísmo e liberdade



Havia planejado beber até morrer naquela maldita noite.
Não estava bem, não me sentia feliz e nem realizado. Me sentia sozinho e irritado e estressado, e perdendo minha vida, e por isso que planejava beber até morrer. Pois bem, eu tinha um litro e meio de vodka em casa, eu não morreria, talvez gorfasse, com muita sorte, muita sorte mesmo, eu teria um coma alcoolico, entraria numa daquelas ambulâncias do SUS, prosseguiria pra emergência, ficaria uma noite e um dia sendo abastecido de soro, glicose e tudo mais, e se eu gorfasse muito sangue, ou ainda, cagasse muito sangue, eu teria que fazer uma transfusão, o que pra mim é tranquilo, uma vez que meu sangue é aquele tipo compatível com todos os outros (esqueci o nome dele, acho que é "AB"), enfim, eu beberia muito naquela noite. O trabalho havia me sugado mais um pouco da minha vida, que era lentamente morta por mim, e eu seguia em direção à minha casa, quando o telefone tocou:

- Carlos? É o Edu mano. Beleza?
- Sim, sim, tudo certo...
- Saindo do trampo agora?
- É sim mano - eu disse - aquela porra me sugou mais umas 11 horas hoje, tô de saco cheio daquela merda.
- Vem aqui em casa, vamos beber e vou chamar uns amigos pra conversar. Traga aquela sua garrafa de vodka que eu sei que você tem em casa e pare de beber como um alcoolátra.
- Mas alcoolismo é bom, alcoolismo é liberdade... Quando estamos sem esperanças é quando somos mais livres man! - eu disse, esboçando o filósofo logo cedo.
- Para com isso - ele disse com ar de reprovação - esse lance de alcoolátra solitário é uma merda. Logo logo cê tá chorando pelos cantos e abraçado numa garrafa.
- Foda-se mano, me sinto bem assim, e assim prosseguirei. Estarei em casa, beberei sozinho. Se quiserem me acompanhar, venham até minha casa e serão meus convidados para partilhar da minha frustração.
- Beleza, iremos lá então. Contaremos com você ein! Não apague antes de chegarmos.
- Ok, tanto faz - e desliguei o telefone.

Pareço uma menina mimada olhando assim, uma daquelas criadas com o pai em cima, e que depilam a buceta loira desde novas, e que ficavam com os garotinhos bombadinhos de cabelo arrepiado e de familia estruturada. Sei lá, podia até ser, mas parece que quanto mais eu fugia das pessoas, mais elas apareciam, e eu nada podia fazer em relação a isso. A displicência é somente mais um mecanismo pra conquistar as pessoas, quanto mais maltratadas e rejeitadas e xingadas e criticadas e odiadas as pessoas são, mais elas correrão atrás de você, isso era um fato, e entendia agora porque sempre perdia as mulheres, porque eu queria ser o bom rapaz, e isso definitivamente é algo que elas não querem. Isso cansa. Isso deixa elas entediadas. Perdi muito por causa disso. Enfim, chega de divagações bêbadas! Estava finalmente em casa! Tirei as calças, a camiseta, o tênis, me mantive somente de cuecas e meias, joguei tudo no chão do quarto. Fui na cozinha, peguei a garrafa de vodka barata, acho que era uma que comprara recentemente, seu nome era Raskov, era uma dessas "falsas russas", mas que custavam pouco, cheiravam a alcool Zulu e te apagavam, e eu nem precisava de mais do que isso pra me sentir, não digo melhor, mas digo menos frustrado com as coisas e as pessoas e os textos e as leituras e os gênios da literatura e o vinagre e os protestos e a PEC e tudo mais, e o Resende nas tragédias também! Pois bem, eu somente bebia, deitado no sofá. Com muito esforço me levantei, busquei algo bom pra tocar, passei pelos gênios Anathema, Alice in Chains, Cazuza e resolvi parar em Los Hermanos e Little Joy. Sempre me sentia melhor ouvindo estes caras barbudos, com suas músicas que falavam de amor e da vida e da porra toda. Coloquei o album Ventura pra tocar, logo seguido do album 4 e do album do Little Joy, que honestamente não me lembro o nome, mas ainda assim era muito bom. Coloquei tudo no repeat, ou seja, tocaria até a hora que eu apagasse, ou ainda, até a hora em que eu acordasse. Quando me deitei no sofá, abraçado à minha garrafa de Raskov, a campainha tocou. Praguejei, me levantei, cocei o cu e tomei coragem. Fui atender a porta.


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Era Edu e um outro povo. Não tinhamos mulheres, ou seja, não espere uma daquelas minhas histórias em que eu sou chupado, ou que eu fodo uma mina bêbada e feia, ou que pago por sexo, ou todas aquelas loucuras que sempre relato. Nem espere um caso homossexual também, estava muito macambúzio pra dar ou comer ou beijar outro cara. Por fim, a noite se resumiria em chatices e mais chatices, ao menos com um bom alcool no sangue e só!

- E aí Carlos! Trouxemos drinks! - Edu me disse entusiasmado, como se eu ligasse pra drinks, pufff, eu não dava a mínima, eu montava vodka com água quando queria drinks, mas estava conseguindo beber bem vodka pura mesmo.
- Ok, coloque as coisas na cozinha.
- Valeu valeu... Esses são meus amigos, que disse que traria.

Eu só via um monte de macho, com cara de hipster e de intelectual de merda, que liam Normam Mailer e Dostoievski e Rimbaud e o próprio Augusto dos Anjos, e nem entendiam o que esses caras falavam, cuidavam de reciclagem, eram vegetarianos, moravam na Bela Cintra e cheiravam cocaína o dia todo e pagavam de inteligentes. Acho que está claro que não fui com a cara dos sujeitos. Entraram todos, se acomodando no sofá (rasgado, sem querer numa pira de alcool, mas isso é outra história), sentaram e esperaram brotarem brejas em suas mãos. Eu simplesmente me sentei na minha poltrona reclinável, que usava pra pensar, abraçado da minha garrafa.

Edu voltou com brejas nas mãos, e pra ele um drink leve de St. Remy com refrigerante de guaraná. Só eu bebia pesado, eu não ligava pras consequencias pro figado e talz, eles sim, cheiradores de merda hahaha pagando de ativistas. Aposto que eles estavam na Paulista a favor da legalização da maconha hahahahahaha. Eu ria sem parar por dentro, "como deixei entrar pessoas assim na minha casa?" Eu pensava e ria, mas enfim, não colocaria os caras pra fora com vassouradas né!? Bebiamos bem de boa, eles falavam dos assuntos deles, sem muita variação, sabecomoé, papo de ambientalismo, e musicas Indie e as baladas novas ali da Augusta e da Brigadeiro e da Frei Caneca, até da Alameda Lorena. Eu só olhava, mas os caras querem me foder, só pode, só querem me foder, falando de religião e talz. Tinha um dos caras, não sei o nome e nem quero saber, que dizia acreditar em Deus e talz, e frequentava a igreja e tudo mais e eu só olhava, mas ele queria me foder e me envolveu na conversa.

- E você Carlos, acredita em Deus? - ele disse, tragando aquele maldito cigarro de menta.
- Putz, certeza que querem ouvir minha opinião? - eu disse ainda tentando salvar as coisas.
- Claro - ele disse - É sempre bom ouvir opiniões novas - e tragou de novo o cigarro de menta.
- Deus está morto. Se existisse um Deus, ao menos pra mim, esse seria o alcool, uma vez que é nele que me apoio. Todo o resto é balela, masturbação pro ego. Foda-se o que você pensa, jamais concordarei contigo. Ateísmo é liberdade, alcoolismo é liberdade... Agora com licença, vou pro quarto terminar de matar minha garrafa de vodka, antes que eu mande vocês todos tomarem no cu.

E sai da sala sem despedidas. Só queria me deitar, beber e dormir e com sorte morrer, ou ainda, o sonhado coma alcoolico, e esquecer da minha vida. Que a morte seja mais suave do que isso.

Zaratustra

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