domingo, 9 de junho de 2013

Os ricos frustrados e sozinhos



Eu bebia. Olhei pro monitor, percebi que a tela estava em branco. Percebi que eu sempre começava meus textos com a frase "Eu bebia". Certamente havia perdido a criatividade, mesmo bêbado, mesmo sóbrio, eu não conseguia escrever nada, nada mesmo. Tentei de novo, e nada de novo. "Merda, merda!" Sentia que aquilo já havia acontecido várias vezes antes, e isso me fodia os culhões, me roia, me irritava. Eu queria que tudo fosse mais simples, que as ideias saissem como poesia da minha cabeça doente. Mas o fato é que eu não havia me tornado um gênio da literatura. Sim, eu tinha bons textos, mas esse negócio de escrever é pra gente muito intelectual, e não para alcoolátras como eu. Me senti um fracasso. Respirei fundo, acendi um cigarro, traguei ele como a minha vida, que vai embora assim, rapidamente, sem que eu perceba. Olhei de novo para o monitor. Precisava de palavras difíceis e que fizessem algum sentido. "Porra!" Praguejava, percebia que isso não iria acontecer tão cedo, talvez nunca, ou ainda, talvez acontecesse numa hora em que eu não pudesse escrever nada, ai perderia a ideia e me foderia.

Levantei da cadeira, desliguei o computador. Fui na cozinha, peguei uma cervejinha e deitei no sofá, fumando cigarros atrás de cigarros. Queria ficar na maciota, estava cansado de me matar pra escrever. Iria relaxar, e que se fodam meus textos. Deveria parar com isso, uma vez que a qualidade estava decaindo, e eu estava me sentindo incomodado. Precisava desabafar, mas como? Como reclamar de tudo o que eu queria, se não fosse utilizando textos? Foda-se, eu ia voltar pro telemarketing, ganhar 600 conto por mês, voltar pra casa da minha mãe e me afundar no fracasso, bebendo todos os dias e dormindo nas sarjetas. Estava revoltado.

Prosseguia bebendo minhas brejas, uma atrás da outra, claro, e foda-se meu fígado, que doia há duas semanas, e foda-se minha úlcera que latejava cada vez mais. A campainha tocou. Me escondi debaixo das almofadas do sofá. Tocou novamente, permaneci escondido. Estava muito macambúzio para ver pessoas, e principalmente para interagir com elas.

- Carlos! Carlos! Sei que você está aí! Me atende porra! É o Felipe!

"Merda, merda, merda" Precisava atender, mas não queria. Não que o Felipe fosse alguém especial, mas ele sempre tinha boas ideias pros meus textos, nos dávamos muito bem quando conversávamos. Levantei com muito esforço meu rabo gordo do sofá, óbvio que praguejando a sociedade, mesmo sem ter motivo. Abri a porta com a cautela de um francês.

- Oi Felipe.
- E aí mano! Beleza? - ele perguntou e já veio me dando um abraço.
- Beleza cara. E por aí?
- De boas, de boas.

Ficamos um olhando pro outro, com caras de idiotas. Percebi que teria que ser gentil, ao menos daquela vez, e pedi pra ele entrar em casa. Ele entrou e foi direto na geladeira, pegou uma breja e foi pro sofá. Nos sentamos, acendemos um cigarro cada, eu fumava Marlboro vermelho e ele fumava Lucky Strike, mas isso nunca foi problema.

- Percebi que você está meio isolado Carlos. Tá tudo bem?

Sempre a mesma pergunta... "Claro que nada está bem, mas não adianta ficar chorando por aí, em redes sociais, como os ricos e frustrados fazem quando passam o sábado sozinhos e chorando em seus apartamentos luxuosos, com os cus cheios de dinheiro e a alma vazia de esperança", pensei, e dei a resposta óbvia.

- Tá tudo bem, tá tudo bem...
- Não me parece, mas se você diz, ok.

Ficamos mais um tempo quietos, olhando um para o outro, sem saber exatamente o que fariamos. Ele me fitava com um olhar de culpa e pena, e eu simplesmente era apático, como sou na maioria das vezes.

- Mais alguma coisa brother? - perguntei, torcendo para que a resposta fosse não.
- Na verdade não... Só não quero que você se torne uma daquelas pessoas frustradas, ricas e solitárias.
- Man, eu nunca vou ser rico, pois bebo tudo o que eu ganho. Então fique tranquilo, passarei minhas noites de sábado bem acompanhado, com boas doses e bons livros.
- Beleza. - ele me disse, já se despedindo de mim.

Fechei a porta, respirei fundo. Peguei mais umas latinhas de cerveja e fui pro quarto, tentar escrever um texto sobre os ricos frustrados e sozinhos.

Zaratustra

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