domingo, 29 de setembro de 2013

Um casal e uma cama



Não rolaria putaria naquela noite. Foi o que deu pra perceber quando Fernanda colocou seu pijama de flanela, que era confortável mas nada atraente. Jorge também parecia desanimado pra coisa, ele usava uma cueca samba canção e uma camiseta regata branca (roupa típica pra dormir). Estavam casados não havia muito tempo, se me lembro bem eram uns 8 anos, mas caralhos, o fogo inicial já havia passado né? Nem sombra de quando eles tinham acabado de casar, em que era sexo todos os dias, às vezes duas ou três vezes por dia. No fim das contas, conforme vamos envelhecendo, o sexo e a putaria acaba perdendo e muito a prioridade. Percebemos que a vida tem muito mais a oferecer e buscamos isso (visão otimista) ou simplesmente perdemos as esperanças e desistimos das coisas (visão pessimista) mas independente do que seja, é fato que a constância das relações diminui.

Pois bem, o que restava naquela quinta a noite era deitar na cama e esperar o último dia da semana de trabalho, no caso deles era sexta-feira, eles tinham empregos decentes (ao contrário do Carlos aqui hahahaha). Aí que Jorge deitou no lado direito da cama, com o abajur aceso e um livro nas mãos, era um daqueles livros clichês de evolução pessoal, O Monge e o Executivo. Já ela, romântica incorrigível, preferia ler revistas femininas, daqueles "Perca X quilos em X dias com a dieta X", e que falava sobre auto-estima para mulheres sem auto-estima. Sim meu caro leitor, era um casal típico. A mulher insegura com o casamento e o homem cansado, mas ao menos por causa do cansaço, ele era fiel. Dava muito trabalho trair ela, era no máximo uma brincadeirinha com os colegas de trampo quando passava aquela secretária gostosa, em que ele dizia "Caraio, que mulher gostosa ein! Se eu tivesse dinheiro eu comia sem dó!" Mas era só falastrice mesmo, todos nós sabemos que se dependesse dele seria difícil de rolar, e se dependesse da secretária era impossível de rolar.  Fernanda olhava pra ele incessantemente, e ele despreocupado prosseguia com a sua leitura.

- Jorge, precisamos conversar! - ela disse de repente.
- Ih caraio... - ele disse como reação.
- Que que foi?
- Nada, nada.

Jorge disse que não era nada, mas convenhamos, nunca ouvimos isso quando elas querem conversar coisas boas, era certeza que era problema. E ele estava cansado, que merda, as mulheres escolhem mesmo as piores horas para conversar sobre problemas.

- Pois bem Fê, pode dizer - Jorge falou, olhando nos olhos dela e fechando seu livro.

Ela, ainda meio sem reação, ficou em silêncio por alguns instantes. Depois prosseguiu.

- Sei lá Jorge, só acho que nosso casamento não é mais o mesmo, e isso me preocupa de verdade. Sabe, antes a gente falava mais, era mais carinhoso um com o outro, trocava elogios, e agora é sempre assim, cada um pro seu lado da cama, sem o toque, sem nada. Nem transar a gente transa mais. Eu estou gorda demais pra você?
- Meu Deus Fernanda, quantas vezes eu vou ter que lhe dizer que está tudo bem entre nós. Nosso casamento não é mais o mesmo, isso é fato, mas as pessoas mudam, as relações mudam, e eu ainda te amo. Isso não é o suficiente?
- Ok, se você diz ok - ela prosseguiu - mas eu me sinto carente sabe, e vejo que você não faz nada pra mudar isso. Parece que caiu na mesmice sabe?
- Fê, não quero discutir, estou cansado, amanhã eu trabalho o dia todo, você trabalha o dia todo. Podemos conversar disso outra hora? - ele disse já virando de lado.
- É sempre assim! Você não quer mais nada comigo, aposto que tem outra! - ela disse já com os olhos marejando.
- Nem falo nada sobre isso... Boa noite! - Jorge fechou os olhos pra não assistir a cena.

Fernanda começou a chorar. Jorge simplesmente pediu desculpas e tentou dormir enquanto ouvia o choro soluçante dela. É maldade pra caralho, mas porra, quanta insegurança numa mulher! Parece que elas não pensam no coletivo, não pensam que as pessoas tem que descansar. Jorge tinha perdido sua compaixão, e isso faz parte do casamento.

Zaratustra


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