Esses
dias sempre me fodem. Dias frios, pessoas famosas que morrem. Eu penso demais
na morte. Esse texto vai ficar péssimo, é mais um desabafo. Acabei de ver um
filme completamente imbecil (minha mãe estava assistindo, e eu não tinha nada
melhor pra fazer), que era sobre umas garotas, e um jeans, enfim, era filme de
adolescente de quatorze anos, em que no fim tudo dá certo. Na verdade nem tudo,
e isso me inspirou a escrever esse texto, que espero que seja o último que fale
sobre o assunto. No filme, uma das personagens secundárias morre. Não lembro
exatamente o motivo da morte, tudo o que sei é que ela tinha uns doze anos.
Morte prematura. Aí comecei a pensar na minha morte. Todos os dias acordo com
uma dor de estômago terrível. Costumava tomar remédios, mas eles não estão mais
funcionando. Vomito sangue quase todos os dias. Vomito todos os dias. Eu não
sei, eu sou muito novo pra morrer, mas a gente nunca sabe o dia de amanhã. Eu
acho que ainda vou ser internado com hemorragia interna, ou com cirrose antes
de morrer. Mas eu posso simplesmente cair duro e não ter ninguém pra me
socorrer. Encontrarão meu corpo alguns dias depois, cagado e vomitado no
banheiro. Eu não tenho medo de morrer. O que me amedronta é o processo todo até
lá. Prefiro morrer com um tiro na cabeça do que numa cama de hospital. Eu não
quero sentir muita dor, não quero sofrer. Mas medo do desconhecido, eu não
tenho. Acho que eu já sofri tanto fisicamente, acho que isso seria indiferente.
Mas eu não quero ter que passar por isso. Ter que ver pessoas me visitando nos
hospitais, perguntando em qual quarto estou internado, dormindo em sofás, me
assistir morrer. E médicos atônitos, loucos pra tentar resolver um problema. Ou
ter câncer, ter que aguardar um transplante. Puta merda, isso seria mesmo uma
bosta.
Estranho
pensar na minha morte. Sei lá, acho que eu penso que ela está próxima, por isso
é melhor deixar esse texto batido (mesmo que eu não publique, sei que Luís vai
pegar ele). Muitas dúvidas me perseguem. Quantas serão as pessoas que irão ao
meu enterro? Quantas serão as que realmente vão chorar, de forma honesta, assim
que eu morrer? O que vão fazer com meu quarto, com minhas coisas? E meu
emprego, eles vão se virar sem mim por um tempo? E minha namorada, será que vai
ficar muito traumatizada? Meus pais, não sei como eles vão reagir a tudo isso,
meus amigos, enfim, todas as pessoas. Eu não quero machucar elas, eu não posso
machucar elas, de jeito nenhum. Elas não merecem ficar com esse monte de nada.
Não merecem ficarem de luto. O mais bizarro é pensar que o mundo vai seguir do
mesmo jeito. O lixeiro vai pegar o lixo, o porteiro ainda vai abrir seus
portões, os jovens vão estudar pra entrar na USP. Tudo vai ser igual. Mas e as
pessoas que gostam de mim, o que elas farão? Com quem vão beber quando quiserem
conversar? Eles vão sair de carro, vão buscar cocaína, e eu não estarei lá, eu
não vou falar com o traficante. Eles jamais ouvirão minhas histórias vindas
direto da minha boca. Talvez eles se reúnam, e lembrem “Porra, lembram quando o
Carlos fez isso? Lembra quando ele fez aquilo? Ele foi uma lenda...” E talvez
alguém chore ao se lembrar de mim, ao ouvir minhas histórias. Quem vai ocupar o
quarto lugar no carro do meu amigo policial? Quem vai abraçar minha namorada?
Sei que ela vai arrumar outro cara, afinal ela é sim diferente de todas as
outras. Mas não vai ser a mesma coisa. Cada pessoa tem suas características
próprias, seus trejeitos únicos. Espero que ela não sofra muito. Espero que a
morte me abrace antes de me levar. Que eu possa olhar pra ela e chorar de
emoção. E que tudo se torne melhor do que é. E que as pessoas não fiquem de
luto. Coloquem uma garrafa de vodka na minha lápide. Independente de qualquer
coisa, eu vivi no limite, e jamais me arrependerei disso.
Carlos Reis
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