terça-feira, 15 de abril de 2014

O último dia do garoto suicida



O dia estava garoando e
ele pensou
“Sorte ou revés?
Dessa vez era sorte”
Pensou, e resolveu
se levantar
Tomou um bom banho e
aparou a barba
passou gel nos cabelos
Se olhou no espelho e
transpirava confiança
E o dia estava frio
(além da garoa)
“Tem dias que não
é bom nem
sair de casa”
Um mal pressentimento
lhe bateu,
mas ele ainda estava confiante

Pegou o ônibus
pegou o trem e é mesmo
incrível como a sorte
vira revés de uma hora
Pra outra
e ele pensou nas garrafas
que ele não havia
tomado na noite anterior
E ficou triste
por estar sóbrio naquele
exato momento
Bom, mas já que estava
por ali
Passou em um shopping
 num determinado
bairro que lhe causa
Más recordações
(mulheres)
É curioso o fato de que
todas as grandes mulheres
da vida dele
Haviam passado por ali
por aquele shopping
Pediu um chopp
viu pessoas
Teve uma idéia
Foi cortar o cabelo e ficou
mais apresentável
Recebeu um telefonema
“Filho, estou sem
dinheiro”
disse sua mãe
“Tudo bem, tudo
bem”
Ele engoliu a seco
ele também não tinha
e nem seu pai
e nem ninguém
E mais uma vez ele
tinha que carregar o mundo
nas costas

Pegou o trem de volta
pra casa
(estava cheio)
Mas tudo bem
Voltou a pé pra casa
debaixo da chuva
Acho que uma gripe
era o menor dos seus
problemas
E ele tomou mais um
banho
(o segundo do dia
o que de fato
pra ele era recorde)
Colocou um tênis bem bonito
Uma das suas melhores
calças jeans
Uma camiseta do
Pink Floyd
penteou os cabelos
que estavam recém cortados
Pegou uma corda
escondida
Arrumou uma boa viga
no seu quintal e
subiu numa cadeira
Amarrou a corda na viga
e a outra ponta ele fez um nó
que envolvia o seu pescoço
Ainda em cima da cadeira
deu um último gole
no seu vinho barato
Não teve medo
nem fechou os olhos
nem pensou muito
Apenas chutou a cadeira
e não se lembra mais

de nada

Carlos Reis

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