Eu
prosseguia com meus problemas financeiros, mas ainda assim eu era um bom
sujeito. Dinheiro não é tudo, ao menos eu achava isso, e esperava que as
pessoas achassem isso também. Eu sei, eu sei, as vadias jamais veriam dessa
forma, mas tudo bem. Apesar de endividado, eu ainda ganhava uns trocos com meus
textos (sim, eu sabia que ele só fazia sucesso entre drogados, alcoólatras e
malucos, mas quem não é ao menos uma dessas opções hoje em dia?), e com esses
trocos, eu por vezes saia pra uma grande noite de bebedeira. Sempre sozinho.
Quando se tem dinheiro, seus amigos se multiplicam por quatro. Quando se está
duro, eles se dividem por oito. E minha realidade era essa. Todos haviam
sumido, de uma hora pra outra. De qualquer forma, eu havia ganhado uma grana
com um texto. Essa grana, eu apostei no poker, e fiz ainda mais dinheiro. Eu
tinha mais sorte com cartas do que com pessoas.
Por
volta das 19h, coloquei uma roupa limpa. Nada muito exagerado. Jeans, camiseta
e tênis, vestuário básico de qualquer jovem com 20 e poucos anos. E frustrado.
Com muitas notas de cem no bolso, saí. Não sabia exatamente aonde iria naquela
noite. Tudo o que eu tinha era dinheiro, ódio das pessoas e vontade de destruir
coisas e sonhos.
Cheguei
num belo boteco na região da Santa Cecília. Tocava boa música. Alice in Chains.
Os drinks eram baratos. Se comprava uma dose de Balalaika por quatro reais, ou
uma garrafa de Itaipava por cinco, ou ainda, uma dose de Contini por três. Eu
estava “sem escorpião no bolso”, como dizem, e resolvi pedir logo os três de
uma vez. Misturei o Contini na Balalaika e fiz um drink. A garrafa de cerveja
estava ali, mas deixei ela um pouco de lado. Beberia de leve. Ainda assim,
servi um pouco num copo de boteco. Eu estava muito bem mesmo! Na TV, passava
futebol, claro que sem som, pois tocava Alice in Chains, e isso jamais
mereceria ser atrapalhado. A noite tinha tudo o que eu queria, eu bebia
sozinho, e já me distraia ao assistir o garçom atrapalhado pelo fato de ser seu
primeiro dia, uma idéia de conto já me rondava. Mas quando se bebe como um rei,
sempre existe um bobo da corte pra te foder.
- E
aí chapa?
- E
aí cara – eu respondi por educação.
-
Beleza cara?
-
Beleza, e você?
-
Tudo ok.
Ficamos
parados e quietos por cerca de dois minutos. Eu bebericava meu drink, por vezes
a cerveja. Ele só observava.
-
Então, - ele disse – você parece estar muito bem! Qual é a comemoração?
-
Não tem comemoração cara – eu respondi – só estou bebendo, como todos fazem.
-
Todos é o caralho! Ninguém pede três drinks ao mesmo tempo como você fez.
-
Bom, digamos que eu gosto de beber, cara... – eu respondi, irritado – mas o que
você quer man, fala logo.
- Nada
mano, nada... Relaxa... Só tô puxando assunto. É muito errado tentar ser
sociável?
-
Não, mas quando não se está bebendo é ao menos esquisito.
-
Ok, você venceu. Tô a fim de uma breja, mas estou duro.
-
Porra cara! – eu disse ainda mais irritado – Se você tivesse sido honesto desde
o começo, seria mais fácil pra eu te pagar drinks.
-
Que merda mano!
- Se
o senhor quer saber, - eu disse, dando uma golada fatal no meu drink – eu estou
até endividado. Sério isso.
-
Ah, conta outra.
-
Juro.
- E
como você tá bebendo com essa propriedade toda? – ele apontou para os drinks.
-
Ganhei dinheiro no jogo...
-
Jogo do bicho?
- Tá
me tirando!? Poker cara, poker é jogo de homem.
-
Saquei... Mas e aí, vai me pagar uma cerveja ou não?
- Se
eu te der um copo cheio, você vaza e para de me encher o saco?
-
Com certeza!
Pedi
outro copo ao garçom, enchi, ele tomou tudo numa única talagada. Nos
despedimos, pronto, ele ia encher o saco de outra pessoa em outro boteco, e,
com sorte, conseguiria ficar bêbado sem gastar um puto sequer. Sujeito de
sorte. Enquanto isso, minha garrafa de cerveja já estava chegando ao fim.
Resolvi pedir mais uma maria-mole, que me custou mais cinco pratas. O som era
muito bom, fluía entre Alice in Chains, Nirvana e Silverchair. Aquela porra
devia ser um bar grunge, e escondido, com certeza.
O
futebol já chegava ao final, minha dose de maria-mole também estava próxima de
acabar. Me senti realizado. Percebi que não precisava das pessoas pra me
divertir. Álcool, boa música e uma coisa na TV que eu não precisasse pensar:
isso me bastava. Estava já saciado disso. Eu precisava naquela noite de uma
vadia.
2.
Paguei
minha comanda e saí cambaleante do bom bar secreto em que tocava grunge. Estava
a fim de um puteiro. Andei umas quatro quadras pra cima Dalí, fui “puxado” pra
um lugar com mulheres “do mundo”. As moças de lá não eram feias, eram
horríveis. Uma pior do que a outra. Mas tudo bem, eu soube que com as trinta
pratas que eu tinha pagado pra entrar, eu teria direito a tomar uma caipirinha
e duas cervejas. E era isso o que eu faria. Justificar o meu direito. Fui
direto ao bar, pedi a primeira cerveja. Observei o lugar. Não estava muito
cheio, e algumas putas chegavam em mim, mas eu as dispensava com um simples
“não vai rolar”. Por vezes é muito bom poder dizer isso, ao invés de só ouvir
isso, como sempre acontece comigo. Minha segunda breja estava ajudando a achar
elas um pouco mais bonitas, mas ainda assim a situação era bem complicada.
Uma
garota chamada Luana chegou em mim. Ela era gorda, feia, dentes podres, cabelos
quebrados, seios flácidos, bunda caída, cara de pobre... seu rosto era
definitivamente a pior parte do seu corpo. Acho que se eu tentasse foder ela,
eu iria acabar no triângulo das bermudas, comendo cocos e caçando peixes, pois
era banha demais.
- E
aí gato, tá a fim de se divertir hoje?
-
Não não chuchu, vim pra beber.
-
Mas você pode beber em qualquer lugar. Porque justo aqui? Deve haver algum bom
motivo.
-
Querida, veja bem... Como você chama mesmo?
-
Luana, e você?
-
Carlos... Então, veja bem, o que conta é a vista. Você pode comprar um
refrigerante e beber em casa, ou você pode ir ao zoológico e lá, pedir o
refrigerante.
-
Nos compara a animais gato?
-
Não! Pode usar a analogia do refrigerante com cinema também. Eu venho beber em
puteiros para ver belas mulheres.
Eu
sei que de belas elas não tinham nada (talvez fosse melhor que eu tivesse ido
ao cinema, ou ao zoológico mesmo... mas ai ficaria no mínimo estranho que eu
bebesse). Ainda assim, a analogia era bem válida e sensata.
-
Entendi – ela disse, passando a mão direita na minha virilha – qualquer coisa
me chame – ela saiu sorrindo, com os dentes mais podres do que comida vencida.
-
Haha, podeixar. – eu respondi com uma falsidade tremenda.
Estava
óbvio que eu não falaria com ela, mas pra que inventar intriga? Uma boa mentira
é por vezes necessária pra se evitar um confronto desnecessário.
Minha
cerveja acabara me restou a caipirinha. Pedi. Não estava tão ruim. Achei que
usariam Corote, mas usaram o bom e Velho Barreiro. Sem querer ser repetitivo
(mas já sendo), não estava tão ruim. De fato, naquela altura, depois de uma
longa noite de bebedeira, descia muito bem pela minha garganta.
Foi
então que eu a vi. Sim, era a melhor garota do local. Eu juro que não era
efeito da bebida (eu acho... que juro?), ela era mesmo linda. Nada no estilo
modelete. Mas de cabelos vermelhos, pernas torneadas, seios robustos, barriga
bem desenhada. A bunda era comum, mas eu não ligava (melhor comum do que feia).
Eu queria uma vadia e ela foi a escolhida. Nem esperei acabar o meu drink.
Cheguei nela de forma direta. O bom de puteiros é que se pode ser canalha ao
quadrado. Você pode tratar elas como lixo, e ainda assim as levará para a cama.
E foi isso o que eu fiz com aquela ruiva.
-
Gata, vamos pro quarto! – eu disse, pegando ela pelo braço.
-
Nossa, que rapaz direto! Gostei! – ela retrucou com um sorriso de ponta a
ponta.
Passamos
no caixa, desembolsei umas boas cento e cinqüenta pratas, mas valeria a pena. E
eu ainda bebia a caipirinha, lógico.
No
quarto eu fui ainda mais canalha. Ela disse que queria luz apagada.
-
Vamos apagar a luz?
-
Não. Prefiro luz acesa.
-
Ah, mas eu prefiro apagada.
-
Ah, mas eu que tô pagando – eu disse, ironicamente.
-
Ok.
Era
isso, ela tinha que baixar a cabeça. A mulher objeto tem seu sentido mais claro
numa puta.
-
Vamos fazer papai-mamãe? – ela disse.
-
Não, fica de quatro. – eu disse, secamente.
-
Mas...
-
De... qua... tro!
E
ela teve que obedecer de novo. Ah, e pra variar ela mentiu sobre o meu pau,
disse aquele discurso padrão de putas, que era o maior de todos, que ia doer
pra entrar e tudo mais, mas por mim de boa, eu nunca via problema nisso, sei
que elas eram pagas pra mentir.
Tive
uma boa noitada, álcool, grunge e uma trepada decente. Voltei pra casa
satisfeito, mas eu sabia que seria outra labuta pra ganhar aquele dinheiro de
novo. Eu sou canalha com a puta enquanto a vida é canalha comigo. E assim que
tudo segue.
Carlos Reis
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