segunda-feira, 7 de abril de 2014

A formatura



Acordar às 19h, com uma ressaca fodida, e só porque a porra do despertador tocou. Sim, eu havia tido mais uma das minhas grandes noitadas, mas naquele dia iria rolar a parte dois. Eu ia a uma formatura, de uma prima, vamos chamar ela de Kelly. Kelly morava em outra cidade, bem mais afastada da minha. Tinha trinta e cinco anos e uma filha de uns quatro. Ainda estava muito inteira pra sua idade, era loira, alta, mesmo muito bonita. Apesar da idade, ainda atraente, estava recém separada e pegando um ou outro cara por aí. Estava se formando em arquitetura. Pois bem, eu me levantei com aquele maldito despertador, fodido. Eu estava completamente fodido. Vomitei (geralmente vomitava sempre que acordava. Início de cirrose, mas isso é outra história...), tomei um bom banho. A noite anterior tinha sido pesada. Muita cocaína, aí misturo com álcool e maconha e aí me fodo. Mas torno a repetir isso. A maldita festa exigia roupa social. Bom, eu tinha um sapato surrado, uma calça social surrada e uma bela camisa branca. Ahh sim, e um paletó. Mas sem gravata. Nunca gostei de gravatas, aliás, maldita roupa, só aperta teu pescoço e te fode. Minha prima me ligou:
- E aí Carlos? Tudo bem?
- Sim Kelly, e você?
- Também. Você vem hoje né?
- Vou sim, acabei de sair do banho. Minha mãe vai também. Logo logo encontro ela e vamos.
- Ah que ótimo!
- Sim, só não tenho a porra da gravata. Precisa dela pra entrar?
- Acho que não, mas se precisar a gente dá um jeito.
- Tudo bem então. Beijos prima, até mais.
- Beijos primo, quando chegar liga pra gente entregar os convites.
- Tudo bem, até.
Desliguei o celular e me arrumei. Não me considerei elegante, odeio estar elegante, minhas roupas são no geral velhas e surradas, só compro quando realmente perdi. Já tive camisetas perdidas e não fiz questão de comprar outra pra repor. Isso porque odeio comprar roupas, mas aí já é outra história, vou parar de divagar, juro. Pois bem, eu estava pronto. Saí de casa e fui encontrar minha mãe, que estava indo direto do trabalho.

2.

Me encontrei com a minha mãe eram por volta das 21h50, no terminal rodoviário. Fizemos nossas formalidades, achamos um guichê que vendia nossa passagem, com o próximo ônibus para as 22h. Compramos as passagens e pegamos o ônibus. Achamos nossas poltronas, a minha ficava no corredor, a da minha mãe na janela.
- Mãe, troca comigo. Odeio sentar no corredor, aliás, eu preciso da janela. Vou vomitar durante a viagem.
- Tudo bem – ela disse.
Nos sentamos, eu levei uma garrafa de vinho. Não era medo de viagens, mas me enchia andar de ônibus e não poder beber. Vai ver eu era só um alcoólatra. Acho que sim, acho que eu era só um alcoólatra, nada além disso. O ônibus saiu, entrou na rodovia, e eu bebericando meu vinho. Conversava trivialidades com a minha mãe, sem grandes novidades. Naquela fase da minha vida eu estava me dando mesmo muito bem com ela. O papo fluía, eu bebendo mais vinho. Chegaria na festa bêbado, mas tudo bem, eu ainda estaria bem. Durante a viagem eu ia vomitando de leve pela janela, e entornava mais vinho. De uma certa forma eu estava abrindo espaço pra beber mais, e isso era bem bacana. Quanto mais eu pudesse beber, melhor seria. A viagem era longa, cerca de duas horas. Não havia transito. Eu com a janela aberta sentia o vento bater com violência no meu rosto. Sensação agradável, sensação agradável.
- Seu lance com a Tammie é sério? – minha mãe perguntou.
- Sim, estamos namorando, agora é oficial.
- Ahh sim.
- Tem algum problema nisso? – retruquei.
- Nenhum, ela parece ser uma boa garota, gostei dela.
- Que bom, posso sempre levar ela em casa então.
- Pode sim – ela finalizou – será sempre bem-vinda.
Nisso eu fui pra janela e vomitei mais um pouco.
- Meu Deus Carlos, você está completamente fodido – minha mãe me disse.
- Culpa da porra da viagem – retruquei.
- Ou da porra da bebida – ela disse – Você vai ficar de boa na festa?
- Vou sim, vou comer alguma coisa e tomar cervejas. Se eu ver que não está voltando a comida, continuo a beber. Se eu ver que está voltando, paro de beber, pra não levantar toda hora pra ir vomitar.
- Tudo bem – agora ela finalizou completamente.
Parecia uma viagem interminável, mas chegamos ao tal lugar. Parecia um clube de pompa. Pessoas jovens, bonitas, bem arrumadas. Sonhos sendo construídos, a idéia de que um diploma pode lhe fazer ser rico deve ser bacana. Fora que a faculdade era particular, minha prima era uma das bolsistas, os outros eram em geral filhinhos de papai.
Cheguei na entrada e telefonei pra minha prima, sem sucesso. Talvez ela estivesse ocupada, eu não sabia como eram as formaturas, nunca havia ido a nenhuma. Nem na minha própria. Na época em que me formei, estava duro, bebia corotes e não pagava as contas, mas isso é outra história. Liguei pra minha tia.
- Oi tia, é o Carlos.
- Ahh, oi Carlos. Já chegaram?
- Sim, estamos aqui na porta.
- Ok, aguardem aí que estou descendo com os convites.
- Tudo bem – eu disse e desliguei.
Joguei a garrafa fora, estava vazia, tentei parecer mais sóbrio, masquei um chiclete. Esperava agüentar mais uma noitada sem grandes problemas.

3.

Minha tia e minha avó foram nos recepcionar com os convites. Entramos sem problemas (mesmo eu sem a gravata), demos um longo abraço. Não sou exemplo de nada, mas essa parte específica da família é bacana, gosto mesmo dela. É a parte festeira da família, portanto eles não me julgavam por seguir um estilo de vida pesado. Eu e minha avó nos dávamos bem, sempre nos falávamos pelo telefone. Ela era bem bacana, teve um estilo de vida pesado quando mais nova, mas estava muito bem para os seus sessenta e sete anos. Minha tia também estava em plena forma, acabara de completar setenta anos e ia a bailes, dançava, bebia, era falastrona. Duas senhoras bem bacanas, e se eu estou falando isso, é porque eram mesmo. Gente velha geralmente é chata. São ranzinzas e cheios de querer mal. Odeiam os jovens e estão cansados. Definitivamente, eu não gostava de velhos. Mas minha avó e minha tia, sim, essas eu gostava.
Entramos, dei meu convite na recepção da porra toda, ele rasgou uma parte e me entregou o resto. Guardei no bolso e prosseguimos pra festa. Haviam duas mesas dedicadas à minha prima (não sei se todos tinham duas mesas, acho que sim), numa delas estava a família e na outra o ex marido e os patrões dela. Não sou bom nisso, sou uma merda, mas tive que cumprimentar a todos e sorrir. Pessoas que eu mal conheço. Cumprimentei meu primo, ele era até que bem suave na bebida, tinha casado e tido uma filha. Ele bebia brejinhas. Os patrões e o ex marido foi o tradicional, apenas um aperto de mão. Haviam duas amigas mais próximas da minha prima, uma delas era linda, seu nome era Taís. Loira, corpaço, um verdadeiro tesão. Dei um beijo no rosto dela, amiga de infância da formanda. A outra era a Alexandra, até que era bem bonita, mas o rosto parecia de um travesti. Por isso que vou chamar ela de Alexandra, porque isso pra mim é nome de travesti. Outro beijo no rosto. A questão era: aonde sentar. Podia me sentar ao lado da minha mãe, ela se sentou ao lado da minha tia (que era o lugar mais perto da garrafa de vodka que tinha na mesa. Aliás, garrafas, duas de absolut), preferi somente naquela noite me sentar ao lado da minha avó, pra botar o papo em dia. Me sentei, ao meu lado estava a Alexandra e na sequência a Taís.
Me servi um pouco de comida. Salgadinhos variados, coxinha, bolinha de queijo e uma outra parada de camarão. Era meio que um risoles de camarão. O bom de cidade litorânea é isso. Camarão a rodo. Eu queria que se fodesse, estava ali de graça, eu ia comer pra caralho, todo camarão que eu pudesse agüentar. Depois de estar bem alimentado, experimentei a cerveja. Desceu sem problema algum. Continuei bebendo cerveja. Acho que não gorfaria naquela noite (e foi o que aconteceu). Minha prima pegou a garrafa de absolut, me mostrou e disse
- Porra primo, eu sei que você adora vodka, toma aí. Comprei justamente porque sei que você gosta.
- Desculpe prima, cortei a vodka. Tive sérios problemas por causa dela.
- Ahh, então tudo bem – ela disse, jogando vodka no seu drink.
Resolvi ficar só nas cervejas. Alexandra bebia cervejas também, minha avó, meu primo, um outro cara que não me lembro o nome, e acho que assim eu não teria problemas. Minha mãe tomava a vodka como uma esponja, minha tia bebericava de leve, só golinhos pequenos. Tais bebia algum drink que não sei o nome.
Minha avó era muito carinhosa. Me abraçava, me dava aquilo que minha maldita carência sempre pediu. Cogitei morar com ela, mas era muito longe, eu jogaria sonhos demais no lixo (sim, eu ainda tinha alguns)
- E aí meu neto, como andam as novidades? – ela perguntou
- Ahhh vó, algumas novidades sim. Estou namorando.
- Jura? Como ela chama?
- Tammie, garota bacana, 18 anos, inteligente pra caralho, quer ser psicóloga. Bonita. Enfim, não tenho muito o que falar dela, só estou tentando de novo algo sério com alguém.
- E ela é completamente louca. Acertei? – ela perguntou
- Porra... Tu me conhece mesmo hahaha, sim, ela é meio doidinha. Mas não bebe tanto quanto eu.
- Você tem um talento e uma queda por querer as malucas. As outras não te satisfazem?
- No geral me enchem. A mulher maluca, em geral, além de aceitar mais minha bebedeira, são mais inteligentes. As outras eu simplesmente pego, como e jogo no lixo – dei uma mordida na minha coxinha e um sorriso canalha na sequência.
- Hahahaha, esse meu neto não vale nada, mas eu te amo!
- Também te amo vó! – eu disse e sorri de novo, já emborcando mais cerveja.
Ficamos bebendo mais cerveja. Eu e minha avó bebíamos bem. Isso está no sangue. Minha família é alcoólatra, vários já morreram por causa disso, e eu estava fadado a este destino também.
- Tô vendo um trampo novo vó – eu disse
- Porra, que legal. Carteira assinada e os caralhos todos?
- Sim sim, esse vai ser fixo, vou ganhar uma boa grana e me mandar de casa. Morrar com meus amigos. Bons planos, minha vida está dando umas guinadas súbitas. Sei lá, isso me dá medo – eu disse, virando mais cervejas
- Te entendo, mudanças sempre assustam – ela tomou um gole de leve na breja dela – O que tenho de conselhos é o seguinte. Não se apaixone demais por essa garota, Tammie, e quando for morar sozinho, tente maneirar no estilo de vida, porque as chances vão aparecer mais. Foque no seu trampo, tente juntar um dinheiro. Nossa família é o exemplo perfeito de que esse estilo de vida muitas vezes não leva a nada. Drogas e álcool somente te consomem dinheiro e te matam.
- Sei disso vó, tanto que cortei a vodka.
- Meus parabéns a isso. Continue assim, você é inteligente. E os textos? – ela perguntou, virando mais cerveja.
- Estão saindo. Tenho muito poemas, estou escrevendo poemas até demais. Por vezes um ou outro conto. Tenho um livro pronto, vou ver se publico.
- Porra Carlos, que legal! Quero uma cópia quando sair.
- Vou te dar uma com dedicatória e a porra toda que você tem direito (nunca chamei minha avó de senhora, nem ninguém, pra mim somos todos “você”) – eu disse virando mais cerveja
- Você tem talento.
- Obrigado, devo ter.
Continuei bebendo mais, emborcando mais cervejas, e sempre que possível comendo os salgadinhos de camarão. Aquela conversa com minha vó havia me ajudado. Eu estava menos assustado, e seguiria os conselhos dela. A noite ainda estava no começo.

4.

Taís se levantou para ir buscar coisas na mesa de frios. A acompanhei, eu ia estourar nos frios também. Tinha de tudo: queijos variados, salame, azeitonas pretas e verdes, presunto, peito de peru, e umas porras que eu não sabia o nome, mas pareciam gostosas, e por isso eu peguei. A única coisa que eu não peguei foi um bagulho meio marrom com molho, acho que era rosbife, e eu achava essa porra nojenta. Enquanto pegávamos os frios, eu e Taís conversamos trivialidades, coisas curtas, do tipo “Hey, isso parece gostoso” ou “Aconselho a pegar isso, está com uma boa cara”. Voltamos pra mesa.
Nos sentamos. Todos haviam pego pratos de frios, eu já havia mudado de lugar, sentei ao lado de Taís. Alexandra estava dançando. A canalhice estava na minha veia. Puxei assunto com ela.
- Porra, adorei a comida da festa.
- Eu também – ela disse – você é primo da Kelly né?
- Sou sim. E você?
- Conheço ela há anos. Hoje somos amigas. Fico feliz por ela – ela disse e continuou comendo.
- Ahhh sim. Você trabalha com isso também, com arquitetura?
- Não, sou uma empresária. Tenho uma temakeria.
- Porra, sério? Adoro temaki.
- Pode aparecer lá qualquer dia hihihihi, faço um caprichado pra você. Me parece ser um bom garoto.
- Você me chama de garoto mas tem no máximo uns trinta anos. Certeza! – eu disse, bebi cerveja e comi mais frios.
- Tenho trinta e quatro. Mas ô, psiu, não espalha pra ninguém. – ela disse, fazendo aquele gesto de colocar o dedo indicador na boca, pedindo segredo.
- Sério? Juro que não parece. Quantos anos que você acha que eu tenho? – me prostei na cadeira, de uma forma que ela pudesse ver mais o material.
- Uns vinte e cinco... Tem cara de ser vivido, mas de idade ser novo. Vinte e cinco.
- Tenho vinte e três. Tô tão acabado assim? Hahahahaha – perguntei
- Hihihihi, não é isso, acho que você é vivido.
- Já fui casado. Além disso bebo demais – tomei mais cerveja – e vivo sempre no limite. Tenho até cabelos brancos.
- Sua família é assim mesmo hihihihihi... Mas peraí, você casou com quantos anos então?
- Com dezoito. Me separei com vinte.
- Porra, cedo demais. Tem filhos?
- Ainda bem que não. Muita responsabilidade.
- Entendo – ela disse, e virou o drink dela – eu também fui casada, mas tenho uma filha de sete anos.
Ficamos quietos por uns instantes.
- Mas e depois que você se separou? Aposto que curtiu a vida hihihi – ela disse
- Sim! Bebi e tive muitas noitadas.
- E mulheres?
- Algumas.
- E hoje em dia? – ela perguntou, emborcando seu drink.
- Como assim? – dei de desentendido e tomei mais cerveja.
- Você namora? É um garoto bonito, deve fazer sucesso entre as mulheres hihihihi
- Hahahahaha, você está sendo gentil. E comecei a namorar faz pouco tempo, Tammie, uma grande garota. Mais nova, mas é do jeito que eu gosto manja?
- Curte mulheres mais velhas?
- Sempre curti. Tem uma cabeça boa.
- Você é fiel?
- Bom, eu não tenho dinheiro, nem carro, bebo pra caralho, sou tudo aquilo que nenhuma mulher procura. Quando aparece uma tenho que ser ao menos fiel. Acho que respeito é o mínimo que eu posso oferecer.
- Entendi, nem vou te passar meu telefone então hihihi – ela disse, bebendo mais
- Eu nem quero, guarde ele pra você e pros caras solteiros.
- Tammie é uma garota de sorte.
- Para com esse monte de elogios Tais – eu disse, bebendo mais cervejas.
- Sério! Muito cara tem dinheiro, é bonito, saudável, mas trata mulher como um lixo. Você arrumou uma, você está a quilômetros de distância dela, mas ainda assim mantém seu compromisso. Isso é muito raro hoje em dia.
- Isso é porque eu namoro pouco. Desde a separação, que fazem uns três anos, fiquei com algumas garotas. Só uma delas pedi em namoro, e me chutou. Agora essa aceitou, e por isso sou focado em tentar fazer dar certo. Pode ser que ela me chute alguma hora, ou que eu chute ela, mas enquanto existir o relacionamento oficial, vou dar meu máximo. E fidelidade é o mínimo da coisa toda.
- Você ou é muito bom com mulheres ou muito bom com palavras – ela disse, bebendo mais
- Sou mil vezes melhor com palavras do que com mulheres. Mas uma coisa acaba ajudando a outra – eu disse, matando meus frios e tomando mais cervejas.
- Faz assim: quando você chutar a Tammie, ou ela te chutar, vem pra Santos. Você pode dormir na minha casa. Ou minha filha te incomodaria?
- Tudo bem, não me incomodaria com a sua filha. Mas hoje não vai rolar.
- Tammie, Tammie, mulher de sorte hihihihi
- Isso, me deixa mais encabulado – eu disse, rindo.
- Vou levantar pra ir dançar. Quer vir? É só uma dança.
- Sou uma merda nisso, talvez por isso que use bem as palavras. Mas vá lá e dance com a minha prima. Ela tá sozinha. Vou ficar sentado aqui bebendo.
- Tudo bem então garoto.
Ela se levantou e foi dançar. Eu me sentei no lugar dela, pra poder falar ao pé do ouvido com a minha mãe.
- Essa tal de Taís tava dando em cima de mim mãe – eu disse, virando mais cerveja.
- Você vai pegar? – minha mãe disse, virando vodka com kiwi.
- Lógico que não. Tem a Tammie agora.
- Puta merda, é verdade. Meu filho é um lixo, mas é fiel.
- Isso mesmo – eu disse levantando meu copo.
- Mas se você tivesse solteiro, você pegaria? – ela perguntou
- Claro, ela é linda.
- Mas tem uma filha.
- Que se foda. Ainda dava uma boneca pra maldita criança hahahaha
- Hahahahaha, porra filho, você é foda mesmo.
- Valeu mãe, você também é.
Ficamos bebendo por mais um tempo. Eu disse que não sabia dançar, que não iria dançar, mas essa porra dessa noite é foda, e sim, acabei dançando. Mas não foi com Taís.

5.

Eu ainda bebia mais e mais cervejas, mas estava distante da vodka. Curto essas festas, porque você pode acompanhar as pessoas se embriagando e se tornando novas pessoas. Mais chatas, ou mais alegres, andando mole, falando bobagens... Eu ainda estava de boa. Comia demais. Tiveram algumas formalidades, mas chatas demais pra serem mencionadas. Os formandos passando em fila, bla bla bla. Odeio isso, odeio tudo o que é formal.
Após isso, a janta foi servida. Comi mais. Eu não estava acima do meu peso (na verdade eu estava abaixo), portanto podia comer pra caralho sem culpa alguma. Me sentei e jantei, havia massa, camarão e umas outras coisinhas. Peguei mais camarão do que qualquer outra coisa, foda-se, eu ia acabar com o camarão dali. E eles que se fodessem pra arrumar mais. Eu estava curtindo o que a noite podia me dar. Comida e bebida. Eu bebia cervejas como uma esponja. Eram garrafas e mais garrafas. Terminei minha janta e fiquei ali, sozinho, bebendo. As pessoas se levantaram pra dançar, eu sempre odiei dançar.
Minha prima estava na pista, ela veio até a mesa e me pegou pela mão.
- Vamos dançar primo! Para de só ficar aí bebendo... – ela disse, tomando caipirinha de vodka.
- Não sou bom nisso Kelly.
- Tudo bem, não tem importância. Só se precisa saber dançar se for pra comer mulheres. Você não quer me comer mesmo né?
- Não... – eu disse mentirosamente, eu comeria ela fácil.
- Então venha.
- Tudo bem, tudo bem – eu disse me levantando e deixando meu copo órfão na mesa.
Tentei dançar uma ou outra coisa. Eu era horrível nisso (sempre fui). Sou mais do estilo “sentar e beber e ouvir a música”, afinal, ela vai estar lá, tocando, mesmo que eu não esteja dançando. Portanto, eu me sentia meio mal, mas ver Kelly dançar era muito bom. O corpo dela, aos trinta e cinco anos, era bem desenhado, e tinha um bom molejo. As pernas apareciam, o vestido estava um pouco mais subido do que o normal. O ex-marido dela foi um babaca, porque ela era bem gostosa. E seria sempre. As formalidades tinham acabado, portanto ela bebera pra caralho. Nos abraçamos em alguns momentos, ela me beijava no rosto. Será que ela queria me pegar também? Não, isso era impossível, apesar que eu acredito no ditado de que quando estamos solteiros não aparece mulher nenhuma, e quando estamos namorando aparecem pra caralho. Sei lá, ela estava bêbada demais, e de qualquer forma eu não pegaria ela. Ao menos não agora.
Dancei um pouco com a minha avó também. Eu já estava bêbado mesmo (e prosseguia bebendo), então que se foda. A gente dançava de forma completamente errada, mas ninguém ali pagava minhas contas, e por isso não enchiam nosso saco.
Sentei de novo, com a cerveja na mão. Minha mãe, que também dançara, se sentou ao meu lado. Cochichei no ouvido dela.
- Pegar prima não é incesto. Ou é?
- Não é não. Quer pegar a Kelly?
- Não posso – eu disse virando mais cerveja.
- Ahhh sim, Tammie.
- Exatamente.
Ficamos uns momentos em silêncio. Minha prima se sentou ao meu lado.
- Experimenta meu drink – ela disse
- Tem vodka nisso?
- Sim, tem sim. Mas tá maravilhoso.
- Não posso. Te avisei que cortei a vodka.
- Só duas goladas. Porra, eu sou a formanda, eu te faço um pedido e você recusa? Porra Carlos, você é foda mesmo!
- Caralho... Tudo bem, apenas duas goladas.
Me servi. Ahhh, a vodka. O néctar dos deuses. Como foi bom sentir seu sabor de novo. No fim das contas duas goladas viraram dois copos. Eu tomei aquilo como água. Ao menos era vodka absolut, não essas baratas que eu sempre tomei. Vai ver que aquela merda nem me daria apagão. Mas não quis arriscar. Terminei o copo dois e voltei pras cervejas.
Muitos já haviam ido embora. Taís (com um beijo molhado na minha barba), Alexandra, meu primo, os patrões. Restaram apenas eu, minha avó, minha tia, minha mãe e minha prima. Ficamos até o talo. Virei pro garçom.
- Me trás mais cerveja.
- O bar fechou amigo – ele disse.
- Bom, então me dá qualquer garrafa que tenham abandonado por aí. Pode ser?
- Tudo bem, vou caçar garrafas pra você.
Ele me apareceu com duas garrafas, ambas pela metade. E quentes. Mas que se foda. Eu bebia ainda, sozinho. Todos haviam cessado. Quando as minhas garrafas acabaram, eu colei na minha prima, que dançava, já claramente desanimada.
- O bar fechou Kelly. Acho que não há mais nada a se fazer.
- Tem razão, vamos embora.
Na saída ainda tinha um pequeno barzinho. Vi uma garrafa de Contreau. Peguei duas doses. Virei tudo numa única talagada. Minha avó e minha tia tomavam cafezinho. Tinha uma outra garrafa, tava escrito bem grande nela “43” eu imaginei que fosse isso que tivesse de álcool. Ledo engano. Olhei melhor a garrafa, eram trinta e um por cento de álcool. Virei pro garçom.
- Isso tem gosto de que? Nunca vi essa porra.
- Olha, não sei hahahah
- Bom, me dá uma dose.
Ele serviu a dose, tinha gosto de café com álcool zulu. Pedi outra, virei de novo. Falei pro garçom.
- Tem gosto de café, se alguém perguntar, fala que tem gosto de café.
- Tudo bem – ele disse, em agradecimento.
Fomos para o carro na sequência. Minha prima iria dirigir bêbada. Eu peguei logo o banco da frente. Todos colocamos o cinto.

6.

Eu não tinha medo de morrer. De fato, acho que nunca tive. Eu tinha muitos medos, tinha todos eles, mas morte era a única coisa da qual eu não tinha. Portanto, andar de carro com alguém bêbado não me preocupava. O que me preocupava era a porra da polícia parar ela e encher o saco. Apreensão, multas e a porra toda. Isso seria chato naquela noite. Mas sem problemas conseguimos ir e chegar na casa da minha prima. Ela morava num prédio vizinho ao da minha tia, na mesma rua.
Ela estacionou o carro no prédio da minha tia, tirou as sandálias e mal conseguia andar até o seu prédio. Como um cavalheiro, fiz questão de carregar ela. Eu estava bêbado, mas conseguia carregar ela. O que foi decidido é que eu, minha mãe e Kelly dormiríamos na casa da minha prima, minha avó e minha tia na casa da minha tia.
Conseguimos chegar. Eu só tirei meu cinto e meus sapatos, fui ao quarto. Lá tinham duas camas. Uma de casal e uma de solteiro.
- Carlos, vou dormir com você – disse Kelly
- Não, deixe minha mãe comigo, dorme na de solteiro.
- Tudo bem, então sua mãe dorme com você.
Caralhos, ela queria mesmo dar pra mim, certeza. Mas Tammie, Tammie era uma grande garota. Eu seria fiel. Se eu não fosse ao menos isso, eu me sentiria um traste ainda maior. Me deitei com minha mãe na cama de casal, minha prima na de solteiro. Apagamos.

7.

Minha mãe me acordou no dia seguinte. Pegamos nossas coisas e saímos na miúda. Sem estardalhaço. Fomos ao prédio da minha tia. Velhos acordam cedo mesmo depois de um rolê monstro. E elas estavam de pé. Peguei uma latinha de cerveja. Já me sentia melhor. Comi um pão, e peguei outra lata. Papeamos um pouco, somente trivialidades.
O horário urgia nos nossos pescoços. Fomos ao lugar para pegar a van para voltar à nossa cidade natal. Nos despedimos, prometi voltar lá, assim que possível. Isso eram mais ou menos 12h30.
Passei no mercadinho, comprei uma garrafa de vinho, pra viagem de volta. Eu estava até que bem tranqüilo. Minha mãe me pediu uma garrafa de água.
- Tá de ressaca, né vadia? – eu disse, brincando com ela
- Muita. Já não tenho mais idade pra isso. E você ainda bebendo.
- Sim, vai me ajudar na viagem. Me deixa sentar na janela de novo?
- Claro, você vai gorfar sua vida de novo né?
- Pode ter certeza disso.
Pegamos a van eram cerca de 12h45. Me sentei na janela, fui bebendo vinho e gorfei horrores. Mas o rolê havia valido a pena.


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