segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Dormi e não acordei mais



Esse lance de criar expectativas não estava dando certo, mas se não fosse isso, porque eu ainda estaria vivo ouvindo Jorge Ben Jor? Havia algo além de criar expectativas e esperar um retorno de tudo isso? Se existia, eu não sabia, e por isso ainda eu respirava fundo todos os dias e queria parar de beber, eu esperava algo da vida, oh meu Deus, isso era muito raro, esperar algo. Eu bebia porque eu não esperava nada da vida, nem fazia planos, nem pensava em casar e essa baboseira toda que todos amam, e que todos planejam. A vida parecia ser mais fácil quando se pensa que sempre se fracassará, aceitamos mais as coisas e sua cara inchada por causa do alcoolismo não incomoda.

Abri uma garrafa de vodka e troquei a estação de rádio.

E entornar alcool pela goela não é a única coisa que eu fazia, parecia que as palavras escorriam pela máquina de escrever com uma facilidade única, aliás, única não, digo, comparativa com outras coisas mais, como tirar doce de uma criança, ou ainda, mais fácil do que ser um ídolo do sertanejo e comer bocetas de mulheres sem auto-estima. Isso, as palavras eram meu escape, e as garrafas, e resolvi que prosseguiria assim e sem expectativas, "Isso sim, isso sim, isso sim é o mais sensato de tudo" eu pensava alto, realmente pensava alto enquanto eu batia as palavras na máquina e via a coisa toda tomando forma, num lapso quase que dadaísta da coisa, ou simbolista. Eu pensava que as obras de arte eram somente o reflexo de muito desespero humano acumulado.

Continuei com a minha garrafa aberta, mudei a estação de rádio de novo.

A natureza não cria expectativas. Expectativas são os maiores males, no fim morremos sozinhos, e lutamos contra isso a vida toda, mas sabemos que nossa luta é vazia e efêmera e fulgaz. Seria melhor aceitar as coisas e engordar e beber, e ter uma saúde de merda, e começar a cheirar cocaína todos os dias, o dia todo, e perder os dentes, e assoar sangue do nariz, e estar sempre chapado, e saber que seu coração teria o triplo do tamanho num espaço de 10 anos, sim, por causa da cocaína sim! Merda, a garrafa de vodka estava chegando no final, e meu texto estava cada vez pior, mas as palavras saiam com (ainda) facilidade. Respirei fundo, olhei o que havia escrito, odiei, resolvi amassar e jogar no lixo e desisti daquele lance todo, não iria criar expectativas nem pelos meus textos!

Dormi e não acordei mais.

Zaratustra

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